Sourcing deixou de ser sinônimo de “comprar mais barato” e passou a ser decisão de arquitetura de cadeia: quem nos fornece, de onde, com qual risco, custo e nível de dependência.
Nos últimos anos, quase dois terços dos executivos reportaram perdas de supply chain maiores ou muito maiores do que o esperado (Global Supply Chain Risk Report, WTW.
Ao mesmo tempo, 97% dos líderes de supply chain adotaram alguma combinação de aumento de estoques, dual sourcing e regionalização.
Ou seja: sourcing virou tema de conselho. O que está em jogo não é apenas preço unitário, mas competitividade, resiliência e capacidade de crescer em mercados voláteis.
O que entendemos por sourcing estratégico
Quando falamos em sourcing aqui, não estamos falando em “cotação” ou “comprar mais barato”. Estamos falando de um processo estruturado para:
- identificar, avaliar e selecionar fornecedores-chave;
- desenhar a arquitetura da base de fornecimento (quem, onde, quanto, com que contratos);
- e alinhar isso aos objetivos de custo, nível de serviço, risco, ESG e crescimento.
Conteúdos de referência em strategic sourcing reforçam essa visão. A TOTVS, por exemplo, define strategic sourcing como um método que redefine como as empresas gerenciam a cadeia de suprimentos, da seleção criteriosa de fornecedores ao uso de ferramentas avançadas para decisões sustentáveis de longo prazo.
Na mesma linha, a Gartner descreve strategic sourcing como uma abordagem disciplinada que alinha decisões de fornecimento aos objetivos de negócio, maximizando valor e minimizando risco futuro.
Por que o sourcing está mudando: custo continua importante, mas não é tudo
Há pelo menos três movimentos simultâneos, que você confere a seguir.
Volatilidade estrutural
Relatórios como o World Development Report 2020 mostram que cadeias globais de valor respondem hoje por quase metade do comércio mundial, mas estão sob pressão de choques sanitários, geopolíticos e tecnológicos.
Reconfiguração geográfica e pressão por resiliência
A McKinsey mostra que empresas estão acelerando estratégias de dual sourcing, aumento de estoques e regionalização, com 78% dos executivos adotando tanto buffers de inventário quanto dual sourcing em 2023.
Risco de “excesso de reshoring”
Um estudo recente da OCDE, citado pelo Financial Times, alerta que uma agenda agressiva de reshoring e hiper-localização pode reduzir o comércio global em até 18% e gerar perdas de até 12% de PIB em alguns países, sem ganhos claros de resiliência.
O recado para a alta gestão é simples: não dá mais para olhar sourcing só como “reduzir custo por tonelada” nem apenas como “trazer tudo para perto”. A agenda é equilíbrio fino entre custo, risco, resiliência e estratégia de mercado.
As quatro lentes do sourcing moderno
1. Custo total, não só preço de tabela
Falar em custo de sourcing hoje é falar em Total Cost of Ownership (TCO): preço, frete, impostos, lead time, capital de giro, risco de ruptura, complexidade operacional e até custo de mudança de fornecedor.
Relatórios como o “Building the Supply Chain of the Future”, da BCG, mostram que líderes estão aumentando investimentos em digitalização de supply chain justamente para simular cenários de custo e risco fim a fim antes de consolidar decisões de rede e fornecedores.
Sem essa visão, decisões de sourcing continuam sendo feitas “na média do histórico”, e não na fronteira entre custo e resiliência.
2. Risco e resiliência como restrição de projeto, não como remendo
Pesquisas com executivos de supply chain mostram um ponto em comum: dual sourcing, regionalização e estoques estratégicos viraram padrão, não exceção.
Estudos acadêmicos indicam que empresas com menos fornecedores por insumo e cadeias que cruzam múltiplos continentes tendem a enfrentar risco de supply chain mais alto, especialmente quando seus fornecedores também estão expostos.
Ao mesmo tempo, o Global Supply Chain Risk Report da WTW mostra que 65% dos líderes reportaram perdas de supply chain maiores ou muito maiores que o esperado, com impactos fortes em vendas e contratos.
Em outras palavras: risco não é “evento raro”. É variável de projeto. E o desenho de sourcing é uma das alavancas mais diretas para modular esse risco.
3. Serviço, qualidade e acesso à inovação
Em cadeias globais de valor, aquilo que compramos não é apenas um insumo físico, mas know-how incorporado em componentes, sistemas e serviços. O Banco Mundial lembra que GVCs são, antes de tudo, fluxos internacionais de conhecimento entre empresas ao longo da cadeia.
Traduzindo: um fornecedor estratégico pode ser a porta de entrada para novas tecnologias, práticas de operação e padrões de qualidade. Trocar esse fornecedor só por preço pode “baratear” o custo unitário e encarecer o custo competitivo da empresa.
Por isso, sourcing estratégico precisa ponderar:
- SLA e confiabilidade de entrega,
- qualidade e estabilidade de especificação,
- capacidade de co-desenvolver soluções e melhorias.
4. ESG e compliance: o peso regulatório e reputacional das escolhas de sourcing
No Brasil, a Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), ao tratar da responsabilização objetiva de pessoas jurídicas por atos contra a administração pública nacional ou estrangeira, elevou o padrão esperado de due diligence em cadeia de fornecedores.
Mais do que evitar sanções, estamos falando de:
- risco reputacional em mercados regulados;
- perda de contratos com grandes clientes globais;
- e impacto direto em valuation.
Sourcing passa a incluir critérios ambientais, sociais e de governança, além de cláusulas contratuais robustas e monitoramento contínuo de terceiros.
Modelos de sourcing: global, regional, dual, multimodal
Na prática, o debate deixa de ser “global versus local” e passa a ser “como combinamos geografias e modelos de fornecimento”.
Alguns vetores que vemos nos projetos:
- Global com pivôs regionais: uma base global, mas com hubs regionais para reduzir lead time e exposição a choques específicos.
- Dual sourcing em itens críticos: dividir o volume entre dois fornecedores (e, em muitos casos, duas regiões), garantindo um “plano B” vivo.
- Multi-sourcing em categorias de alto risco ou alta volatilidade de demanda.
O relatório “Cost and Resilience: The New Supply Chain Challenge”, da BCG, mostra que várias empresas estão substituindo cadeias globais únicas por múltiplas cadeias regionais, com mais redundância e flexibilidade de sourcing.
Ao mesmo tempo, a OCDE alerta que ir “longe demais” no reshoring e na substituição de fornecedores globais pode destruir valor agregado sem entregar a resiliência prometida.
O equilíbrio está em desenhar uma matriz de sourcing por categoria: onde faz sentido globalizar, onde faz sentido regionalizar, onde dualizar, onde aceitar concentração (com gestão de risco mais intensa).
Dados, tecnologia e IA: o novo motor do sourcing
Sem dados, sourcing estratégico vira opinião bem articulada.
Pesquisas recentes da McKinsey mostram que digitalização de supply chain continua sendo prioridade alta, com a maior parte das empresas investindo em visibilidade, planejamento e análise de risco, apesar de algum arrefecimento no ritmo de investimento em 2023.
O relatório da BCG “Building the Supply Chain of the Future” reforça que líderes estão aumentando investimentos em digitalização (infraestrutura, software, serviços e capital humano) como porcentagem das vendas, justamente para acelerar decisões baseadas em cenários, simulações e automação).
E, mais recentemente, soluções de digital twin de cadeia de valor permitem simular, em ambiente digital, impactos de trocar fornecedores, mudar rotas, alterar níveis de estoque ou reagir a um choque local.
Para a alta gestão, isso significa:
- capacidade de testar cenários de sourcing sem “aprender só na dor”;
- visibilidade granular sobre dependências críticas;
- e governança de risco muito mais dinâmica.
O que isso implica para cargos estratégicos
Na prática, para conselho, C-level e diretoria de logística/supply/comex, algumas responsabilidades novas (ou mais explícitas) surgem:
- Tratar sourcing como parte da estratégia de portfólio de negócios, não só do budget de compras.
- Aprovar princípios de risco de abastecimento: qual nível de concentração aceitamos em cada categoria?
- Garantir que digitalização de supply chain inclua dados de fornecedores, contratos, riscos e cenários, não só visibilidade de transporte.
- Conectar sourcing a ESG e compliance, com métricas, auditorias e consequências reais.
- Manter um diálogo constante entre operações, finanças e comercial sobre o impacto de decisões de sourcing em margem, nível de serviço e posicionamento competitivo.
Mais do que “comprar melhor”, a questão passa a ser: como nosso desenho de sourcing ajuda ou atrapalha a estratégia que queremos entregar nos próximos 3 a 5 anos?
E agora, o que fazer com o seu sourcing?
Se, hoje, seu sourcing ainda é discutido majoritariamente em termos de “preço por unidade” e “quem atende mais rápido”, provavelmente há valor relevante na mesa.
O próximo passo não é sair trocando fornecedor, e sim:
- mapear onde estão as maiores concentrações e riscos da sua base atual;
- entender quanto isso pesa em custo, lead time, capital de giro e risco de ruptura;
- simular cenários de dual/regional/multi-sourcing com dados, não só com percepções.
Se a sua operação depende de fretes internacionais, múltiplos modais e uma rede complexa de parceiros, faz sentido conectar essa conversa de sourcing à forma como você contrata e gerencia fretes – integrando dados de custo, prazo e performance em uma única visão.
É exatamente aí que soluções como a Cargo Sapiens podem ajudar: transformar informações de cotações, embarques e parceiros em insumo concreto para decisões de sourcing mais inteligentes, resilientes e alinhadas ao que a alta gestão está cobrando para os próximos ciclos. Fale agora com a nossa equipe.